A juntar ao absurdo que é manter a marginal como uma via rápida, Cascais ainda duplica o absurdo e tem 4 vias em cada sentido na entrada da vila. Por si só, isto já ilustra as prioridades da Câmara no que toca à mobilidade. As autoestradas têm em geral apenas 3 vias.
Mas a Câmara torna ainda mais explícito o desprezo pelo peão.
Nas passadeiras dessas 2 autênticas auto-estradas, que incentivam e muito à alta velocidade (o princípio da CMC ainda é a "fluidez" de tráfego, como se isso resolvesse alguma coisa), o peão espera imenso tempo pela sua oportunidade de atravessar, e ainda assim tem escassos 20 segundos no caso do atravessamento estação CP-centro comercial, bem contados com um relógio no semáforo.
No atravessamento da D. Pedro I para para o mercado municipal é ainda menos que 20 segundos.
O peão deverá por isso atravessar a bom ritmo, pois são 4 vias - não aconselhável a velhos. Se é idoso, portanto, é bom que só se desloque de carro e entre no ritmo da CMC.
Solicitado à CMC que aumente o tempo de semáforo para os peões, a resposta é a habitual. Nada se faz que ponha em causa a "fluidez" do trânsito automóvel. Afetar a sinalização/temporarização da envolvente em benefício dos peões, ainda para mais em zonas de tanta utilização pedonal? Nem pensar. Aqui o progresso anda de carro:
"cumpre-nos informar que de acordo com a Divisão de Transito e Mobilidade, a temporização da sinalização semafórica está coordenada com a sinalização semafórica na envolvente, pelo que não é possível alterar a temporização na passadeira em causa, sem que isso afete a sinalização/temporização dos semáforos na envolvente.
Foi elaborado um projeto para ampliação da referida passadeira, de forma a que possam atravessar mais peões quando o sinal está verde para os mesmos."-------------------------------------------------------------------------------------------------------
A propósito deste local, é interessante ler este texto de Miguel Barros, publicado em 2024 aqui.
A CORRER Perigosamente para o Autocarro
27 janeiro 2024 | 14h29
A solução encontrada para o novo terminal rodoviário de Cascais, cuja inauguração já vai com um atraso de seis meses, tem tudo para correr mal.
Para se perceber o problema regressemos à trágica manhã de 27 de outubro de 1981.
Nessa altura os autocarros em Cascais eram operados pela Rodoviária Nacional, uma empresa do Estado. O terminal era nos passeios do Largo da Estação e da Rua Sebastião José de Carvalho e Melo. em condições francamente deficientes, onde se misturavam os autocarros, os peões e todo o restante tráfego automóvel. Nalguns casos os passageiros tinham de deixar o passeio e circular no pequeno espaço entre a traseira de um autocarro e a dianteira do que estava estacionado por detrás, para se chegar ao autocarro desejado, estacionado em 2ª fila.
Nessa manhã, um desses autocarros, ao fazer inadvertidamente marcha atrás, esmagou várias crianças que corriam, como era habitual, para apanhar os autocarros estacionados em 2ª fila. Uma dessas crianças era um estudante de 12 anos, aluno na Escola Secundária de Cascais, que faleceu no local.
Quando cheguei ao Largo da Estação nesse dia, para apanhar o 404 (hoje o M04) das 8h15m para a Escola Secundária de Cascais (estava no 8º ano), lembro-me que havia um imenso pandemónio com gritos e muito comoção, e lembro-me também de ver um carro da PSP que se aproximava lentamente, numa cena tipo filme de ação. A minha mãe pensou que fosse alguma situação de violência, colocou-me num táxi para a escola, e foi apanhar o comboio para o trabalho. Só na escola soube o que se tinha passado.
Perante a indignação generalizada da população, 48 horas depois o terminal dos autocarros foi deslocado provisoriamente para a Alameda Duquesa de Palmela, e fizeram-se as habituais promessas da rápida construção de um novo e definitivo terminal rodoviário. A Câmara Municipal de Cascais, na altura liderada por Carlos Alberto Rosa do CDS, publicou um aviso onde indicava “estar já em fase adiantada o lançamento da nova gare Rodoviária na Quinta das Loureiras, bem como a ligação subterrânea à estação dos caminhos de ferro”. As promessas levariam muito tempo a serem cumpridas...
Passados 20 anos destes trágicos acontecimentos, chegamos a novembro de 2001, e é finalmente inaugurado o novo terminal rodoviário e passagem inferior, no seguimento da construção do CascaisVilla. Ora o terminal rapidamente foi deixado ao abandono em que se encontra hoje, e o estado de vandalização da passagem inferior mete medo aos mais corajosos. A placa de inauguração também há muito que desapareceu (mas como na altura era José Luís Judas que estava à frente da Câmara Municipal de Cascais, esta placa não é nada que preocupe o atual executivo, sempre tão atento a placas de inauguração...).
Hoje, quem se desloque da estação ferroviária para o terminal rodoviário, ou vice-versa, atravessa normalmente a Marginal nos semáforos à superfície. É comum ver pessoas a atravessar as 4 faixas da Marginal nesse local, com o vermelho para peões, entre buzinadelas de viaturas, para chegarem rapidamente ao autocarro ou comboio (estes semáforos levam quase 2 minutos entre os verdes para peões). Temos novamente peões a correr perigosamente para apanharem o autocarro...
Como se esta situação não bastasse, a Câmara Municipal de Cascais vai colocar aquilo a que chama o novo terminal rodoviário ainda mais longe da estação ferroviária, requerendo agora o atravessamento de 2 das vias de maior tráfego no centro de Cascais, as 4 faixas da Marginal no sentido Cascais - Lisboa e as 3 faixas da Avenida Dom Pedro I no sentido inverso. E, como reconhecido pela própria autarquia, os abrigos são insuficientes e não há instalações sanitárias, algo que parece ter sido simplesmente ignorado no projeto inicial. Uma suposta pala, a ser construída para cobrir este espaço, não tem data prevista de execução. Vamos voltar a ter adultos e crianças a correr perigosamente entre autocarros e automóveis, e filas que se prolongam pela estrada. Tal como em 1981…
Podia-se ter construído o terminal junto à estação, no espaço que é hoje um parque de estacionamento à superfície, ou até mesmo, por debaixo da estação, soluções que evitavam estes problemas. Em vez disso, optou-se pela solução mais barata...
Uma autarquia que vai gastar milhões de euros num novo terminal de passageiros em Tires, cujo tráfego de passageiros em voos comerciais não chega a 50 passageiros por dia, e que gasta milhares de euros em pipocas, é incapaz de conceber, planear e construir um terminal rodoviário com o mínimo de condições de conforto e segurança, por onde passam milhares de pessoas todos os dias, sobretudo os mais desfavorecidos, as crianças e os idosos.
Carlos Carreiras e Miguel Pinto Luz, com direito a estacionamento reservado ao lado da Câmara Municipal de Cascais não andam de autocarro em Cascais ou noutro lado, e querem lá saber de quem tem de correr perigosamente para apanhar o autocarro.
1981 não se pode repetir. Infelizmente talvez seja apenas uma questão de tempo.
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