ABRIL 2025
A quantidade de tráfego automóvel individual, no qual recentemente é preciso incluir a avassaladora utilização de TVDEs, é grotesca em Lisboa (já nem falo dos ridículos tuk tuk) e tem-se agravado, com fortíssimo impacto na qualidade de vida das pessoas que aqui vivem ou trabalham.
A qualidade do ar é horrível, o ar é tóxico; o ruído lembra o de uma zona industrial; o risco rodoviário é enorme, condicionando a liberdade de circulação a pé ou de bicicleta, e em especial afectando a vida das crianças; os autocarros arrastam-se no meio dos carros engarrafados, com velocidade comercial a decrescer e vias BUS que são removidas, em vez do seu número aumentar; o espaço público é medíocre, totalmente dominado por automóveis em movimento, e legal e ilegalmente estacionados - mesmo as zonas recentemente reabilitadas e votadas ao peão são paulatinamente invadidas novamente pelos carros, à medida que os pilaretes desaparecem (Ribeira das Naus, Cais da Marinha, Campo das Cebolas, …). A cidade é atravessada por absurdas vias rápidas em locais com habitação, serviços, turismo ou comércio, como Forças Armadas/Estados Unidos, Índia, Campo Grande, República, Brasília, etc, etc, onde pessoas são frequentemente atropeladas em passadeiras.
Acabei de passar uma semana numa cidade belga e o contraste não pode ser mais gritante: Lisboa está num estado lastimável, e piora, afogada em carros, ruído e poluição.
Porém o que mais se vêem são medidas que incentivam o uso do carro: milhares e milhares de novos lugares de estacionamento públicos e em edifícios de habitação e escritórios; fala-se agora em mais 6 vias para automóveis entrarem na cidade (!!) vindas da margem sul, como se a cidade não estivesse já atulhada de carros; alarga-se a via rápida da Caparica.
Ao contrário, os projetos de transporte público arrastam-se interminavelmente, de anúncio em anúncio em época eleitoral: LIOS (voltou o anúncio, agora com novo nome), linha de Cascais ligada à Cintura, barcos que nunca mais prestam serviço fiável, Fertagus cada vez pior - e ainda se ouvem inacreditáveis opiniões de afastar a linha de Cascais do centro da cidade, em exacto contraciclo com o que se vê nas cidades evoluídas da Europa que aproximam o transporte pesado do centro! Nos últimos anos a rede ciclável estagnou, ocupando-se a câmara em estender a rede Gira para locais sem infraestrutura e entretendo-se em auditorias para que pareça que algo acontece.
Em face deste panorama negro, a minha contribuição para um plano de mobilidade que humanize a cidade é por isso óbvia:
É preciso reduzir drasticamente a quantidade de carros a circular na cidade, sejam eles a motor térmico, sejam elétricos
Para isso, não bastam intenções eternamente anunciadas: ao mesmo tempo que se vão melhorando as condições para não usar o carro, são absolutamente necessárias medidas restritivas sobre o automóvel: zonas de emissões reduzidas, zonas sem carros, redução do estacionamento disponível e seu encarecimento, redução das vias de entrada na cidade, em vez de aumento, por exemplo convertendo vias normais em vias em BUS (exemplo da A5, que de 5 em 5 anos volta a cima da mesa), portagens
Aumentar a quantidade de vias BUS dentro e no acesso à cidade, fiscalizando os abusos
Garantir em todo o lado percursos pedonais confortáveis, seguros, lisos, sem calçada, sem desníveis, contínuos, coerentes - basta ver e copiar o que se faz noutras cidades da Europa
Garantir uma rede ciclável abrangente, segura, coerente; fazer utilização de contra-fluxos, comuns nas cidades evoluídas
Reduzir a velocidade em todas as vias, incluindo as verdadeiras vias rápidas absurdas que existem dentro da cidade. Nas vias de bairro, impor redução de velocidade por desenho: tipo de piso, sobre-elevação de cruzamentos, obstáculos propositados
Não aumentar as vias de acesso à cidade! Não é isto óbvio? Ao mesmo tempo que os autarcas falam de descarbonização, sustentabilidade e a cidade é uma catástrofe em termos de trânsito automóvel, facilitar ainda mais a entrada de automóveis?
A falácia de que os transportes públicos são todos péssimos, que todas as zonas são igualmente mal servidas e que é preciso esperar que sejam perfeitos para se tomarem medidas restritivas ao automóvel, só serve aqueles que querem que tudo fique na mesma, e assim tem acontecido. Exemplo da ZER ABC mais quatro anos na gaveta , com a área em questão cada vez mais insuportável - a situação na Rua Garrett, Largo Camões, junto da Igreja de São Roque, só para citar uma parte da cidade, é inenarrável e envergonha-me
Ensombrar os percursos pedonais na cidade, como medida de promoção. Em muitos casos a plantação de árvores deverá ser à custa de lugares de estacionamento
Os peões e não utilizadores do carro também têm direito à cidade. Um utilizador de automóvel consome uma quantidade de espaço, provoca poluição, ruído, risco para os outros, de forma desmesurada, o que não pode continuar a acontecer à custa da qualidade de vida de todos os outros, incluindo dos próprios.
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